Kada kin na iasa si bentainha a si manera….Anos es ku no kudji.
Fui nomeado pelo falecido Presidente Malam Bacai Sanha, Director de Relações Internacionais da ANP, onde exerci durante alguns anos, e penso ter aprendido muito com ele e também graças aos meus esforços de autodidacta.
Não sou formado em Direito e nem estou a armar em quem sabe dessa ciência. Sou apenas um estudioso, um curioso que gosta de aprender, por isso é que me aventuro em tecer aqui algumas considerações sobre aquilo de que se tem vindo insistentemente a falar – a revisão da nossa Lei Magna, a Constituição da República da Guiné-Bissau.
Na verdade, em todos os encontros lá fora, quando se fala daquilo que é considerada instabilidade do pais, invoca-se a necessidade da revisão da nossa Constituição, alinhando-a às dos outros países membros da CEDEAO.
Mas, o mais engraçado é que nunca alguém da nossa parte levantou a questão daqueles países alinharem as suas constituições às da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, os dois países lusófonos membros dessa comunidade económica.
Ke, anos i remendaduris, uturs ka pudi remendanu? Lesimenti!
São três os blocos dos países que compõem a Comunidade Económica para o Desenvolvimento Económico da África Ocidental - CEDEAO:
1. Países anglófonos, colonizados ou melhor ocupados durante décadas, senão séculos pela Inglaterra - Gâmbia, Nigéria, Gana, Serra Leoa, Libéria;
2. Países francófonos, colonizados ou melhor, ocupados durante décadas, senão séculos, pela França - Senegal. Mali, Níger, Togo, Guine-Conakry, Benin, Cote d’Ivoire, Burkina Faso e,
3. Países lusófonos, colonizados, senão ocupados durante décadas, senão séculos por Portugal - Guiné-Bissau e Cabo Verde.
Não sei explicar a razão dessa preocupação da parte daqueles que até podemos considerar de amigos, porque pertencemos a mesma sub-região e a mesma comunidade económica, mas apesar de partilharmos o mesmo espaço geopolítico, temos realidades diferentes, em muitos dos aspectos, sobretudo naquilo que herdamos do colonismo.
O sistema que escolhemos livremente adapta-se às nossas realidades. O nosso calcanhar de Aquiles tem sido os homens que elegemos para nos dirigem, para criarem as melhores condições para o desenvolvimento e o bem-estar das nossas populações.
As puxas-puxas a que temos vindo a assistir durante todos esses anos têm a ver com a ambição de controlar os ainda escassos recursos disponíveis, apesar das potencialidades existentes. Dapi goci, ku fadi gora ora ku no bin kumsa explora es recursos!
Os presidentes da República têm sido teimosos em quererem “governamentalizar” a presidência, mas os primeiros-ministros, alguns, têm resistido a essa tentação. Em certos casos, os primeiros-ministros têm também querido “presidencializar” a governação, isto é, têm tentado substituir os presidentes da República no seu papel. Tem existido a tentativa de usurpação de poderes, reciprocamente, e é isso que tem levado ao crónico desentendimento entre os nossos presidentes da República e os primeiros-ministros, Nino-Manel, Bacai-Cadogo, Artur-Cumba e ultimamente Jomav-DSP.
É preciso que os “ remendaduris” se compenetrem de que algumas das realidades doutro lado não adaptáveis às nossas realidades nunca serão aceites na pátria de Cabral. Por mais que se queira aproveitar da “koitadessa” das nossas populações e o obscurantismo em que estão votadas, não vamos aceitar regimes como os do Senegal, da Côte d’Ivoire, Gabão e de outros países francófonos, onde os presidentes são mais do que monarcas, usando e abusando impunemente.
Ora vejamos um exemplo mais flagrante. Como é que, além do orçamento de funcionamento alocado a presidência da República, ao Presidente da República é alocado um orçamento pessoal de bilhões de francos Cfa para gastar a seu bel-prazer, sem ter que prestar contas, orçamento conhecido por “ fonds politiques”. Sabem quantos bilhões é que são postos à disposição de cada um desses presidentes, montantes que não se destinam senão para a compra de consciências, enquanto o povo vive na miséria?
Não conheço bem a realidade de Portugal ou de outros países da UE, mas será que os seus chefes de Estado dispõem desses privilégios? Usar o dinheiro do contribuinte à toa, só para se poder permanecer na cadeira do poder político? É isso que precisamos, num pais onde, pelo menos “anós Cabralistas” fomos ideologicamente educados no sentido de não tocarmos naquilo que a todos pertence?
Este primeiro exercício é para partilhar aquilo que é a minha opinião em relação a revisão constitucional, uma necessidade imperiosa mas que não seja ENCOMENDADA.
Propostas para a revisão da Constituição da Republica:
1. Alinea m), do artº. 68º.
-Assistir e presidir o Conselho de ministros, a convite do Primeiro-ministro, em vez de “ presidir quando entender”.
Alinea p), do mesmo artigo:
-Empossar o Procurador-Geral e procuradores gerais adjuntos, e não “ nomear e exonerar, ouvido o governo, o Procurador-Geral da República”.
A nomeação do Procurador-Geral da República e Adjuntos, entre os pares, garantiria assim maior independência da Procuradoria-Geral da República, evitando-se assim nomeações por clientelismo ou outros fins com o único objectivo de defender interesses que não sejam exclusivamente os do Estado;
Alinea q) Nomear e exonerar os embaixadores, em vez de “ nomear e exonerar……ouvido o Governo”.
Ainda sobre as competências do Presidente da República:
O Presidente da República, nos termos do nº. 2. do art.º 104º. “Pode demitir o Governo em caso de grave crise politica que ponha em causa o normal funcionamento das instituições, ouvidos o Conselho de Estado e os partidos políticos representados na Assembleia Nacional Popular.”.
Concordo perfeitamente com esta disposição porque permite estabilizar as instituições da República, mas no que refere aos poderes de dissolução do Parlamento, tenho algumas reservas.
Deve-se encontrar uma fórmula que torne impossível o Presidente da Republica abusar dos seus poderes, como acontece em muitos países Africanos, dissolvendo arbitrariamente o Parlamento, através da invenção de motivos pouco convincentes. Até propunha que seja eliminado este articulado, porque o Parlamento deve ser uma instituição sólida.
O país, apesar de todos os recursos de que dispõe, não consegue fazer face aos custos com a organização de eleições e a dissolução do Parlamento implica organização antecipada de eleições. Por isso, a eliminação deste articulado permitiria não só ao Parlamento estar ao abrigo de desnecessárias pressões, mas também de torná-lo o mais forte possível.
Condições necessárias à destituição do
Presidente da República
Tendo em conta os excessos que os Presidentes da África cometem, no exercício das suas funções, em relação ao nº.2 do artº. 72º., propunha a seguinte revisão:
“……. sob proposta de ¼ e a aprovação de 3/5 dos deputados em efectividade de funções”, mas que seja um processo célere.
Daí a necessidade de termos um Procurador-Geral eleito pelos colegas, para evitar que em casos como este ele se constitua no maior obstáculo à afirmação de democracia e do Estado de Direito Democrático. Aliás, o estádio de evolução em que atingiu a nossa sociedade, isso já devia ter acontecido logo a seguir ao STJ, onde o respectivo Presidente é eleito no seio da Magistratura Judicial.
Substituição do Presidente da República
por motivos de força maior (artº. 71º.)
A substituição temporária do Presidente da República pelo Presidente da ANP é, quanto a mim, admissível. Mas em caso de morte ou impedimento definitivo, propunha que fosse substituído pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Assim, caso o Presidente da República estiver interessado, o que é um direito fundamental, pode concorrer livremente as eleições presidenciais em pé de igualdade com qualquer candidato.
O facto de substituir o Presidente da República, em caso de morte ou impedimento definitivo, o Presidente do Parlamento é, por força da lei, obrigado de abdicar da sua legítima ambição de se candidatar o que é uma flagrante violação dos seus direitos. “Ma pa Deus libra Guiné es mufunessa más!”
A Constituição da República do Madagáscar resolveu muito civilizadamente esta questão, impondo o Presidente em funções a abandonar o cargo meses antes para se candidatar. Esta disposição constitucional evita a que o PR utilize os meios do Estado para a sua campanha e pôr-se ao mesmo nível que os demais candidatos. Este exemplo devia ser seguido pela Guiné-Bissau para que todos os candidatos estejam em pé de igualdade quando se candidatam ao mais alto cargo do Estado.
Do Conselho de Estado
Artº. 74º. Composição do Conselho de Estado:
a) Ex-Presidentes da Republica
b) Presidente da Assembleia Nacional Popular
c) Primeiro-ministro
d) Presidente da Supremo Tribunal de Justiça
e) Representante de cada partido com assento parlamentar
f) Representante do poder tradicional
g) Representante do poder religioso~
h) Cinco cidadãos designados pelo Presidente da Republica pelo período correspondente a duração do seu mandato
O Primeiro-ministro, que no fundo não é o Chefe do Governo nesses países, funciona como um chefe de gabinete, limitando-se apenas a cumprir as ordens do PR. Uma espécie daquilo que muitos querem para a nossa Guiné-Bissau “tipo tapete”, como se o cargo de Primeiro-ministro fosse o de “mininu di recado”, como se de uma taberna se tratasse ou de uma empresa privada, num país como o nosso onde os melhores dos seus filhos regaram esta árvore da liberdade com o seu sangue!
Proceder à revisão da Constituição da República, uma vez que não vai ser referendada, não é coisa de outro mundo. É só os deputados terem a boa vontade, para se dar o pontapé de saída desde já, uma vez que a ANP é dotada de uma das mais competentes assessorias do país.
Como disse, não sou técnico de Direito sou trained Manager, e deixo este debate aos mais entendidos.
Esta e a primeira parte. A segunda vai seguir logo a noite.
Peace and love!
19 de Novembro de 2018